Autores:
Abílio Rigueira Domingos – CRMV MG 7365
Gustavo de Castro Bregunci – CRMV MG 7160
Resumo: A resistência antimicrobiana é um dos maiores desafios da saúde veterinária moderna. Neste artigo, os médicos-veterinários Abílio Rigueira Domingos e Gustavo de Castro Bregunci explicam como a Inteligência Artificial tem se tornado uma aliada essencial no uso racional de antibióticos, fortalecendo programas de Antimicrobial Stewardship, otimizando decisões clínicas e contribuindo para uma Medicina Veterinária mais segura e sustentável.
Ferramentas baseadas em Inteligência Artificial estão auxiliando médicos-veterinários a combater a resistência bacteriana e aprimorar o uso responsável de antimicrobianos em clínicas e hospitais.
A ameaça invisível da resistência antimicrobiana
A resistência aos antimicrobianos é um dos maiores desafios globais da saúde pública e veterinária. O uso inadequado de antibióticos em animais de companhia e de produção acelera o surgimento de bactérias resistentes, comprometendo a eficácia de tratamentos futuros. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) alertam que o problema exige uma abordagem integrada — o conceito One Health, que une saúde animal, humana e ambiental.
Neste cenário, a Inteligência Artificial (IA) vem ganhando destaque como ferramenta de apoio aos programas de uso racional de antimicrobianos (Antimicrobial Stewardship – AMS), oferecendo recursos analíticos e preditivos que auxiliam médicos-veterinários na tomada de decisão clínica e na vigilância epidemiológica [1].
Como a IA apoia o uso racional de antimicrobianos
A IA é capaz de analisar um grande volume de dados clínicos, laboratoriais e epidemiológicos em tempo real, fornecendo alertas e recomendações personalizadas sobre o uso de antibióticos.
- Análise preditiva de resistência bacteriana, baseada em padrões históricos de sensibilidade antimicrobiana e origem dos casos [2];
- Sugestão automatizada de antibióticos de primeira escolha, com base em protocolos e guias terapêuticos atualizados [3];
- Monitoramento do uso de antimicrobianos em clínicas e hospitais veterinários, identificando prescrições excessivas ou desvios de protocolo;
- Integração com sistemas laboratoriais, permitindo cruzar dados de cultura e antibiograma com características clínicas dos pacientes;
- Educação e treinamento assistido por IA, com feedback em tempo real sobre conformidade com boas práticas.
Esses sistemas, integrados aos prontuários eletrônicos e às plataformas de gestão clínica, contribuem para decisões mais seguras, econômicas e alinhadas às recomendações científicas.
Evidências e resultados práticos
Estudos internacionais apontam que a utilização de sistemas digitais de apoio à decisão clínica (CDSS) com algoritmos de IA reduz o uso desnecessário de antibióticos e melhora a adesão a protocolos de prescrição [4].
Uma revisão sistemática publicada em Frontiers in Veterinary Science analisou 41 ferramentas digitais aplicadas à saúde humana e animal, concluindo que os sistemas baseados em IA foram eficazes na redução do uso indevido de antimicrobianos e no fortalecimento de programas de AMS, especialmente em contextos de poucos recursos [1].
Na medicina veterinária, o avanço dessas soluções vem sendo observado em projetos voltados à pecuária, avicultura e clínicas de pequenos animais. Além da economicidade e da redução de desperdícios, há benefícios diretos à saúde pública, pois o controle inteligente das prescrições veterinárias contribui para diminuir a pressão seletiva sobre microrganismos resistentes.
Desafios e perspectivas
Apesar dos resultados promissores, ainda há obstáculos: a padronização de dados laboratoriais, a interoperabilidade entre sistemas e a necessidade de validação clínica dos algoritmos. Outro ponto crucial é a formação profissional — o uso responsável da IA requer conhecimento técnico e interpretação crítica por parte do médico-veterinário.
O futuro aponta para modelos preditivos mais avançados, capazes de combinar variáveis clínicas, microbiológicas, ambientais e de manejo. A tendência é que esses sistemas se tornem parte dos protocolos de biossegurança e de gestão da saúde animal, integrando-se a programas nacionais e municipais de vigilância sanitária.
Considerações finais
A IA representa uma nova fronteira no controle da resistência antimicrobiana. Ao fornecer dados precisos, recomendações em tempo real e rastreabilidade das prescrições, ela fortalece a atuação do médico-veterinário e contribui para um uso mais racional e sustentável dos antibióticos. A adoção dessa tecnologia, quando associada à capacitação profissional e à integração entre clínica, laboratório e gestão, pode transformar o combate à resistência bacteriana em uma ação mais efetiva e inteligente.
Referências
- YUSUF, H. et al. Expanding Access to Veterinary Clinical Decision Support in Resource-Limited Settings: A Scoping Review of Clinical Decision Support Tools in Medicine and Antimicrobial Stewardship. Frontiers in Veterinary Science, v. 11, p. 1349188, 2024.
- GOMEZ-CABELLO, C. A. et al. Artificial-Intelligence-Based Clinical Decision Support Systems in Primary Care: A Scoping Review of Current Clinical Implementations. European Journal of Investigation in Health, Psychology and Education, v. 14, n. 3, p. 685–698, 2024.
- CLARK, M.; BAILEY, S. Chatbots in Health Care: Connecting Patients to Information. Canadian Journal of Health Technologies, v. 4, n. 1, 2024.
- FELDMAN, M. J. et al. Dedicated AI Expert System vs Generative AI With Large Language Model for Clinical Diagnoses. JAMA Network Open, v. 8, n. 5, e2512994, 2025.
- CONNECTVETS. Soluções em Inteligência Artificial Aplicadas à Medicina Veterinária. Belo Horizonte: ConnectVets, 2025. Disponível em: https://connectvets.com.br. Acesso em: 7 out. 2025.

